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domingo, 22 de janeiro de 2012

CRACK - SAÚDE REVELA OS NÚMEROS DO SUBMUNDO DA DROGA.

Hamilton Pavam
Presença de traficantes e viciados eleva as estatísticas criminais na área e instala a cultura do medo na vizinhança
A Saúde de Rio Preto mapeou 169 pontos usados por viciados para consumo de drogas. As minicracolândias se dividem em 39 mocós -casas abandonadas usadas como verdadeiras senzalas pelos escravos do crack para o consumo de droga - e 130 campos - praças, ruas e terrenos baldios - e são um grande desafio para a polícia e para o serviço público. Nesses locais, a Saúde listou 1.049 usuários de droga, entre eles 16 grávidas.

Além de desvalorizar os imóveis próximos, a presença de usuários, traficantes e toda sorte de criminosos eleva as estatísticas criminais na área e instala a cultura do medo na vizinhança. Medo de entrar e sair de casa, medo de invasão e arrombamento, roubos, furtos e outros pequenos crimes. Para reduzir o número de imóveis invadidos pelos dependentes químicos, a Polícia Militar se uniu a Prefeitura para solicitar na Justiça a demolição dos prédios. Apesar da ofensiva, desde 2010 apenas cinco imóveis foram derrubados nos bairros Paraís, Maceno e Vila União, inclusive a tradicional fábrica de vassouras e uma casa.

Os mocós são o retrato da destruição. Todo e qualquer objeto de valor existente nos imóveis, desde uma torneira velha, batentes e janelas até os fios elétricos dos imóveis, são saqueados e trocados por pedras de crack. Mesmo os ferros da fundação dos prédios viram moeda de troca. Nada escapa do alcance quando os usuários estão na fissura pela droga.

Movido pelo vício como zumbi, o usuário se esquece da própria higiene pessoal, não dorme e nada faz. Vive em ambientes insalubres, repletos de sujeira e com cheiro insuportável de urina. Em suma: degradante. Em apenas 60 dias, o usuário contínuo de crack pode desenvolver graves doenças e até morrer. É o que afirma a professora da Unifesp Solange Nappo, pesquisadora do Centro Brasileiro de Informação sobre Drogas Psicotrópica.

Hamilton Pavam
Polícia Militar faz revista num ponto de consumo de crack na zona do meretrício, em Rio Preto
Moradores com medo

Os vizinhos das minicra-colândias de Rio Preto vivem sob o signo do medo. Na rua que abriga o antigo laticínio da Colar, na Vila Angélica, os moradores evitam sair de casa depois das 20h. Um morador, que não quis se identificar, tem receio de ser roubado. “Moro aqui há dez anos. Ninguém faz nada para nos livrar desse perigo. Além dos viciados, tem lixo, rato, barata e animais mortos.”

No Jaguaré, a situação não é diferente. A comerciante Marli Marçal, que abriu um salão de beleza na sala de casa, convive com o medo de ser assaltada constantemente. Ela é vizinha da antiga UBS do bairro, que foi abandonada pelo Poder Público e acabou saqueada. “É um absurdo viver com medo.” A fiscalização policial frequente não é suficiente para afastar o usuário de pontos tradicionais, como praça Cívica, viaduto Jordão Reis, laticínio e o motel do Jardim Paraíso. Nos dois últimos exemplos, o Diário acompanhou blitz da PM e constatou a situação lastimável causada pela droga.

Na quarta-feira, dia 11, três viaturas foram ao que sobrou do motel. Nos oito cômodos, sete homens, sete mulheres e um menor de 16 anos estavam deitados em camas de cimento ou no chão em meio a sujeira de toda sorte. Foram perfilados e revistados, assim como o prédio. Duas mulheres, após duas noites em claro, não aguentaram: sentaram e dormiram. Uma jovem, que não revelou o nome, fez questão de falar. “Fumo crack 24h por dia. Uma pedra atrás da outra. Tô nessa vida porque quero. A gente fuma e ainda tem um monte de pedra. O cachimbo é a minha família.” Começou com maconha aos 12 anos.

O poder de destruição do crack é exemplificado na ex-cabeleireira D.L.M.. Ela aparenta ter mais que os 35 anos e perdeu, em um ano de uso contínuo da droga, 22 quilos - passou de 64 para 42. Do Pará, mudou-se para Olímpia, em 2009, com o sonho de uma vida melhor. O começo promissor foi logo tragado pela droga.

Primeiro, cheirava cocaína em festas de fim de semana. Depois, passou a usar pedra todo dia. Perdeu o salão de beleza. Hoje, perambula pela zona do meretrício. “Tenho vontade de sair, mas não consigo. É uma vida ruim. Sinto vergonha. É mais forte que eu.” E chorou. Para sustentar o vício, passou a fazer programas. Cobra R$ 30 por hora. Já fez seis programas em menos de 24h. O dinheiro que ganha vai para a droga. “Tenho esperança em melhorar.” Não sabe quantas pedras fuma por dia.
Hamilton Pavam
Suja, mas com cachimbo de detalhes em rosa

No cenário de degradação provocado pelo crack, ainda há espaço para vaidade. A usuária P.M.O., 28 anos, mandou fazer um cachimbo de ferro, com detalhes em rosa, exclusivamente para fumar as pedras. Pelo mimo, gastou R$ 35. “É uma relíquia. Não deixo ninguém usar. Eu até brigo.”

Ela usava roupas sujas, exalava forte cheiro e tinha sujeira no rosto. Apesar da situação, não demostra otimismo ao ser questionada se quer mudar de vida, caso recebesse ajuda. “Um dia, quem sabe?.” Fuma crack o dia inteiro. Nem sabe dizer quantas pedras. Fica em um motel abandonado na zona do meretrício.

Permanece várias noites sem dormir e faz programa para se manter. Negocia o valor com o cliente ou de acordo com a necessidade de momento. Não se anima nem quando fala que é mãe de quatro filhos. As crianças estão com o pai e a mãe dela.
Hamilton Pavam
Pontilhão da movimentada avenida Bady Bassitt é umdos pontos procurados por usuários de crack
Só 30% se recuperam do vício da droga

Apenas 30% dos usuários de droga que procuram tratamento no Centro de Atenção Psicossocial (Caps) de Rio Preto conseguem se recuperar plenamente. Durante o processo, que dura entre seis meses e um ano, sofrem recaídas para a droga, não conseguem mudar o comportamento e círculo de amizades e não recebem apoio familiar. Atualmente, 184 pessoas, a maioria por uso de crack e cocaína, são assistidas pelo Poder Público.

A gerente do Caps Álcool e Droga, Daniela Pavan Terada, afirma que os usuários buscam o tratamento de forma voluntária. No primeiro atendimento, passam por avaliação com equipe multidisciplinar, que vai eleger o principal foco de tratamento. “Nunca chegam com apenas uma questão para se resolver. Às vezes, usam mais de uma droga e álcool. Apresentam depressão, ansiedade, transtorno mental ou problemas de saúde.”

O usuário procura atendimento ao perceber, mesmo com o consumo de drogas, que o uso contínuo de substâncias proibidas causou perdas importantes, muitas vezes irreparáveis, na área social, financeira, familiar e profissional. É acompanhado por psiquiatra, clínico geral, assistente social, psicólogo e participa de terapia ocupacional e oficinas terapêuticas de arte, música e artesanato. A família do dependente também pode receber acompanhamento, mas nem sempre aceitam a abordagem.

“Quando tem uma pessoa que usa droga, ocorre codependência da família. Afeta a vida de todos. A família se fortalece e toma melhores decisões ao aceitar atendimento. Se o grupo não for bem orientado, fica mais difícil ter evolução no tratamento do usuário.” O psiquiatra Marcelo Ribeiro, da Unifesp, afirma que a solução é o Poder Público identificar os grupos, se aproximar deles e oferecer tratamento. “São pessoas que estão socialmente comprometidas. Precisam de apoio, moradia e ajuda social. É necessário criar políticas para resgatar essas pessoas da marginalização.”

Redução de danos

O acesso aos serviços de saúde para os dependentes químicos que vivem escondidos nos mocós de Rio Preto é realizado por uma equipe de seis pessoas, sendo quatro agentes de saúde e dois técnicos - um psicólogo e uma enfermeira. O grupo de Redução de Danos do Programa Municipal de DST/Aids tem como objetivos levar para os usuários informações sobre os perigos que o entorpecente causa para a saúde e também aconselhá-los sobre noções de higiene, realizar atendimentos de primeira necessidade, como curativos.

De acordo com informação da coordenadora do programa, Aracelis Castro Aschar, além desses serviços oferecidos, a equipe que percorre os mocós entrega, para os usuários, kits para diminuir, entre eles, a incidência de doenças sexualmente transmissíveis, como a Aids e as hepatites B e C.

“Sabemos que a dependência química é algo muito difícil de superar, então não adianta apenas dizer que aquilo faz mal. Caso essas pessoas permaneçam no vício mesmo com nosso aconselhamento, entregamos os kits para que não proliferem essas doenças transmissíveis. Dentro do kit entregamos seringas, preservativos, protetores labiais e materiais informativos”, explica a coordenadora do programa.
Hamilton Pavam
Usuária encontrada em motel abandonado na zona norte: ‘escravidão’
Os escravos da pedra

A Secretaria de Saúde de Rio Preto mapeou 1.049 usuários de drogas na cidade, destes 16 são grávidas que estão sendo acompanhadas pelo Programa Municipal de Redução de Danos. O acompanhamento é feito desde a detecção da gravidez até o nascimento dos bebês que, na maioria das vezes, são encaminhados para algum parente ou então para a adoção, de acordo com a coordenadora do programa de DST/Aids, Aracelis Castro Aschar.

“Essas mulheres precisam de muitos cuidados. Primeiro pela gravidez que, por si só, já requer atenção. No caso delas, como são poliusuárias de entorpecentes e vivem em locais sujos e com várias pessoas, a atenção tem que ser redobrada. Damos todo o apoio, desde noções de higiene, como também encaminhamos para as Unidades Básicas de Saúde. Em alguns casos, nós mesmos levamos a gestante para os exames”, diz a coordenadora.

Aracelis explica que a gravidez é constante na vida das mulheres viciadas em crack, uma vez que elas não usam preservativos e possuem vários parceiros. “Muitas delas se prostituem para conseguir o dinheiro e nessas relações não se protegem, daí engravidam e adquirem diversas doenças.”

Durante o acompanhamento as agentes de saúde tentam também identificar os parceiros. “É quase impossível saber quem é o parceiro de quem, uma vez que eles vivem na promiscuidade e nem lembram o que fizeram durante a noite, pois sempre estão drogados”, complementa a agente de redução de danos Luciana Rabadan.

Vítimas do crack

O casal Rodrigo e Aline (como se identificaram para a reportagem) estava dormindo em meio à sujeira do antigo laticínio da Colar, na Vila Anchieta, no mesmo colchão sujo e fétido. Eles se conheceram nas drogas e delas não veem como sair. “É muito difícil sair dessa vida, somos usuários e queremos apenas viver em paz. Não é a vida que eu pedi para Deus, mas é aquela que me deu.” Ambos contam que começaram a usar o crack pela influência de amigos e depois disso nunca mais conseguiram sair.

P.R.S., 38 anos, começou a usar crack por brincadeira. Órfão de pai e mãe, mora na rua há oito anos. Fuma várias pedras de crack por dia. Para manter o vício, pega materiais recicláveis ou faz bico. “Se tem droga, uso mesmo. Viver assim é complicado.” No dia anterior à entrevista para a reportagem, havia feito apenas uma refeição, graças à ajuda de um desconhecido. “De vez em quando peço comida.”

Ele afirma que caiu de cabeça no crack quando o filho, de apenas nove meses, foi abrigado em uma casa social. Diz que não consegue autorização para visitar o bebê. Nem tem condição de ficar com ele. “Isso me faz usar crack ainda mais.” A droga tirou tudo do caminhoneiro P.R.S., 43 anos. Após duas décadas trabalhando no transporte de carga pesada, foi levado ao vício por influência de uma mulher e perdeu o caminhão. Há quatro anos “experimentou” e, desde então, perdeu quase tudo. “Estou nessa vergonha. Quando cai nessa, ninguém te ajuda”, diz ele, pai de um jovem de 23 anos e avô.

Solução são ações conjuntas

Para conter o avanço dos usuários de droga em Rio Preto, o delegado seccional Joseli Donizete Curti afirma a necessidade de ações em conjunto na área social e de saúde, além do trabalho de repressão, investigação, prevenção e educação, “É necessário orientar o jovem sobre os riscos da droga. Se diminuir o consumo, cairá a oferta.” Curti diz que a droga é a porta para outros crimes. O usuário, para manter o vício, trabalha para traficantes ou pratica furtos e roubos. “Um roubo, inclusive, pode acabar em latrocínio. A polícia tem conquistado resultados expressivos.”

O delegado André Balura, da Delegacia de Investigações Sobre Entorpecentes (Dise), afirma que a Polícia Civil tem conhecimento dos mocós, mas que pouco pode fazer para coibir o uso porque, apesar de ser crime, não há pena prevista. “Ela é detida, presta depoimento e é liberada. Essas pessoas precisam é de tratamento.”

Prevenção e repressão

O capitão Nedson Nobre afirma que a PM combate o uso e o tráfico de drogas com policiamento preventivo e repressão. “A polícia realiza abordagens das pessoas presentes em mocós ou pontos de uso, que incluem consulta de antecedentes criminais e varredura de toda a instalação à procura de drogas, armas ou objetivos ilícitos.”

Quando depara com casas em situação de abandono, com risco à segurança pública, o policial elabora um relatório e o encaminha ao órgão competente para adoção de medidas cabíveis em cada caso. Já o capitão Marcelo Perin Monteiro, responsável pelo policiamento na zona norte, afirma que desde o ano passado o trabalho nessa área é focado em inibir o tráfico, uso e também a circulação de entorpecentes. Foram registradas 198 ocorrências (2009), 288 (2010) e 307 (2011). “Estamos em cima dos lugares críticos.”
Divulgação
Casal Manoel Carlos e Júlia de Fátima: unidos e libertos do vício
Casal venceu junto o vício das drogas

Em meio a tantas histórias tristes, uma luz se acende. O casal Manoel Carlos de Lima Andrade, 30 anos, e Júlia de Fátima Ranzani, 24, está junto há nove meses. Ambos moram atualmente na Comunidade Terapêutica de Catanduva, que trata viciados em drogas. Eles se conheceram durante o tratamento.

“Comecei meu tratamento há mais de um ano, vivi por 12 anos no mundo do crack. Morava sozinho em Rio Preto e conheci a droga. Comecei a usar e não queria mais sair, mas um dia minha mãe conversou seriamente comigo e isso mexeu muito, daí ela me encaminhou para Catanduva, onde estou até hoje. Desde que pisei aqui sabia que meu mundo havia mudado, e mudou mesmo”, afirma Manoel.

Já Júlia foi dependente por seis anos, mas a droga foi mais cruel com ela. “Tentei me recuperar por três vezes, mas sempre fugia das casas de apoio. Só quando engravidei que consegui parar. Mesmo assim usei o crack ainda por dois meses enquanto estava gestante, mas venci. Meu filho, que está com apenas dois meses, é minha única razão de viver, não volto mais para aquela vida.”

Júlia foi Miss Pindorama e se envolveu com o crack pelas amizades. Foi um caminho que quase não teve volta. “Eu me envolvi com pessoas erradas, mas graças a Deus, consegui sair do vício e hoje quero ter uma vida digna, casar, trabalhar e cuidar do pequeno.”

Demolição das ‘cracolândias’

A Prefeitura pediu à Justiça a destruição de três imóveis na zona do meretrício. “A demolição é o único jeito de acabar com os mocós,” afirma o promotor público Sérgio Clementino. O secretário de Serviços Gerais, Paulo Pauléra, afirma que notifica o dono do imóvel abandonado quando recebe solicitação da PM. “Pedimos para limpar e fechar. Quando isso não ocorre, recorremos à Justiça.”

A secretária-interina de Assistência Social, Roseli Bernardes, diz que a pasta tem equipe que busca moradores de rua, entre os quais usuários de droga, e oferece os serviços públicos. A equipe de abordagem social, no entanto, não entra mais em mocós e pontos de uso, em razão do risco.




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Raul Marques e Victor Augusto


FONTE: Diarioweb

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